Continuando com a saga do ícone do terror nacional Zé do Caixão, após um
primeiro filme alucinante e original, José Mojica Marins deu continuidade com a
história do coveiro e em 1967 ele lançou o segundo filme com o personagem, Esta Noite Encarnarei no teu Cadáver. Esse
segundo filme continua exatamente de onde terminou À Meia Noite Levarei Sua Alma.
Em minha opinião, esse filme é superior ao primeiro e também eu o
considero o melhor filme do Zé do Caixão, por que aqui temos três aspectos
diferentes, não desmerecendo o filme À
Meia Noite já que este também é um clássico. O que torna Esta Noite um filme com tamanha
magnitude são as cenas muito mais aterrorizantes do que antes, aprofundamento
da filosofia de Zé e claro a cena clássica do inferno em cores.
Após sobreviver ao ataque sobrenatural no final de À Meia Noite Levarei Sua Alma, Zé do Caixão (José Mojica Marins) é inocentado de seus
crimes por falta de provas. Novamente de volta às ruas, o coveiro ainda não
desistiu de seu propósito de gerar um filho perfeito a partir da mulher
superior. E com a ajuda de seu criado, o corcunda Bruno (Nivaldo Lima), ele rapta seis
mulheres e as submetem a um teste macabro utilizando dezenas de tarântulas. A
mulher que não sentir medo poderá ser a escolhida, do contrário, as
consideradas inferiores morrerão.
Esse evento culminará em mais assassinatos, onde uma das vítimas jura
voltar do mundo dos mortos e encarnar no cadáver de seu assassino. A população
também se manifesta contra os crimes do coveiro, a maioria acreditando que Zé
do Caixão tem pacto com o demônio. Mas Zé, por outro lado, continua cético e
faz chacota com o povo supersticioso. E quem ousa interferir em seus planos se
tornava mais uma de suas vítimas.
No entanto, há algo novo nesse filme em relação ao anterior, duas
mulheres partilham da mesma filosofia de Zé. Uma delas chamada Márcia (Nádia Freitas) foi a única aprovada no teste
das tarântulas e se torna a partir daí, uma cúmplice dos crimes dele, embora
ela não tenha o aceitado se tornar a mãe do tão sonhado filho do coveiro. E a
outra é Laura (Tina Wohlers), uma jovem filha do coronel que se engraça para Zé do Caixão,
ignorando os conselhos da família e até mesmo a morte do irmão. Era esse tipo
de mulher que Josefel Zanatas procurava: aquela que não esbanja
sentimentalismos ou crenças religiosas.
Falando das cenas de tortura, José Mojica Marins foi ousado em usar
aranhas enormes e serpentes para atormentar suas vítimas. Imagine o desafio que
as atrizes tiveram que encarar? O sadismo do personagem chega a impressionar
durante o filme todo, mas apesar de toda sua crueldade, tem momentos que ele
diverte o público ao usar falas de deboche para com suas vítimas como em uma
cena antes de matar um jovem, ele diz:
“Se
passares pelo céu, dê lembranças aos anjos. Mas, se teu destino é o inferno, dá
meu endereço ao diabo.”
E mesmo diante de muitos crimes, há momentos em que torcemos para que o
coveiro cumpra seu propósito. Não sei explicar como isso acontece, talvez seja
pelo carisma do personagem e o modo de enxergar as coisas. Claro que sua
filosofia exagera muito quando ele se considera superior às outras pessoas, mas
sua maneira de enxergar o sangue e as crianças, parece que tudo faz sentido.
Mas enfim, aqui não defendo crença ou filosofia. Como é bastante evidente, o
diferencial de Esta Noite é os
inúmeros discursos de Zé do Caixão, alguns julgaram um filme muito mais
filosófico do que terror propriamente dito. Mas discordo completamente disso.
Se quiserem ver terror, Esta Noite
Encarnarei no teu Cadáver cumpre isso muito bem. Principalmente na melhor
cena do filme, Zé do Caixão está em sua cama, quando ele vê uma criatura sinistra
andando pelo quarto até que o agarra pelo pé e começa a arrasta-lo da casa até
o cemitério. Uma vez lá, Zé do Caixão é agarrado por mãos que saem da terra e o
puxam para baixo, fazendo com que ele caia no inferno. Ali ele vê pessoas sendo
torturados, gritos, pedidos de socorro, corpos pendurados e mutilados, e o
coveiro que se considera superior assiste a tudo isso apavorado, pois muitas
das almas ali eram de suas vítimas. Toda essa cena do inferno foi filmada em
cores, uma grande façanha de Mojica. Não é atoa que ele é um dos cineastas mais
admirados do Brasil.
Mas infelizmente este filme foi manchado pela censura. Na época de seu
lançamento, o Brasil se encontrava sob o domínio do governo militar que
censurava tudo que saia até dos jornais. No caso do filme, Mojica foi obrigado
a alterar o final, fazendo com que Zé do Caixão reconhecesse que deus existe
antes de supostamente morrer. Isso ficou ridículo! Pois desde o primeiro filme,
temos o conhecimento de que Zé jamais iria acreditar nisso, mesmo depois de
sofrer o ataque de almas penadas e depois sobreviver ser inocentado, ele
continuou o mesmo, além do mais, ele tem uma personalidade muito forte para se
submeter a isso.
Não precisa nem falar o quanto Mojica havia ficado irritado com essa
imposição da censura, mas ou ele cedia à exigência ou nunca poderia lançar seu
filme nos cinemas, e assim não poderia recuperar o dinheiro gasto com a
produção. Para a maioria dos fãs, a censura enterrou o personagem Zé do Caixão,
e isso durou muito tempo. Pois só foi em 2008 que foi lançado o terceiro e último filme da saga, onde Mojica longe de qualquer imposição conserta todo o
estrago que censura da década de 60 fez com sua obra. Mas mesmo com todo isso, é inegável o fato de que este filme foi uma grande produção, mesmo em uma época sem muitos recursos. Eu disse que é para mim o melhor filme do Zé do Caixão, mas também é o melhor filme de terror feito em território brasileiro.
NOTA: 8/10
Veja o trailer no vídeo abaixo:
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